quarta-feira, 22 de julho de 2009

Destreinada

Meu vô morreu.
Como eu disse pro Vinícius (http://www.pavulso.blogspot.com/), parece que esse é o tema do mês: a morte. O que esperar de agosto? O dito "mês do cachorro louco"?
Meu vô era uma pessoa "interessante". Ele maltratava minha vó, roubou meu pai dela algumas vezes, ele só fazia o que queria, rodou o mundo um pouco, ficou na pior um tanto. Só nos procurava em caso de hospital e, ainda assim, quando ficava bem fugia de lá sem deixar pistas.
Eu lembro de querer contato (quando nasci ele e minha vó já estavam separados) e mandar cartas, às vezes fotos. Lembro de uma ou outra visita. Numa delas a gente foi vê-lo no açougue onde ele trabalhava. Eu lembro bem por que em cima do açougue tinha uma locadora pornô e eu subi as escadas e vi a primeira cena de suruba da minha vida. A gente tinha levado uma água de cheiro de presente pra ele e quando ele recebeu perguntou se a gente achava que ele cheirava mal. Ficou furioso com o 'mimo' e a visita acabou mal, como sempre.
Eu desisti dele em uma dessas fugas. Ele precisava se cuidar, tínhamos o encontrado em um barraco repleto de pulgas e doente e eu pedi, chorando, que ele ficasse com os cuidados, mas ele olhou calmamente pra minha expressão chorosa e disse: não. Daí em diante eu pensei nele poucas vezes, o vi menos vezes ainda e isso tudo virou só um assunto a ser evitado.
Hoje, quando a minha irmã me acordou com a notícia, ela a dizia com um "sorriso" de canto de boca e jogou-a em cima de mim.
"O vô morreu, de AVC, e já foi enterrado" - ela falou de uma vez e despretensiosamente. Sim, ela também não sabe como lidar com esta relação.
Me parece mais difícil lidar com a morte dele do que com a sua vida. Enquanto ele vivia me parecia natural manter distância de quem já tinha causado tanto mal aos que eu amo e que não fazia esforços por aproximar-se. Agora não. Agora, como tudo, me parece que eu deveria ter insistido mais, que eu não poderia desistir de alguém a quem se chama "vô". Agora eu não posso mais optar não vê-lo, não pensá-lo e não falar dele. Ele já foi, levou com ele as opções, as oportunidades, o que poderia ter sido e não foi.
E eu fiquei aqui, destreinada na morte para o que já estava tão bem treinada na vida: evitá-lo.

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