quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Dança e nojo

Chamou Luiza pra preencher os espaços dele. As coisas não funcionam como na sua cabeça, precisa ver pessoas, ver as outras pessoas, precisa ver afinal.
Matriculou-se em um grupo de matemática. Preferia arte, preferia meditação. Mas nada disso servia. Precisava ocupar a cabeça com não-paixões, não-expressões. Precisava não-pensar.
Todos os nãos que vieram com um único sim a punham maluca. Não via sentido, mas esforçava-se, sofregamente, para dançar conforme a música dos não-ser.
Em sua mente era tudo um equívoco de ocasião. O tempo - o tempo da insegurança - está todo ao contrário!
- Que grande brincadeira é essa? Não é hora da insegurança! Mais tarde.. quando eu estiver cansada dos teus hábitos, das tuas conversas; mais tarde quando os pequenos incômodos tornarem-se defeitos insuportáveis e teus interesses não me interessarem mais..
mais tarde, quando eu quiser dar voltas com outras pessoas e puder me interessar por elas,
quando eu quiser fugir de todo o costume..
essa é a hora pra me deixar insegura!
Algo diz que quando essa hora chega, não lhe impõem insegurança, não lhe pedem pra dançar, nem pra se ir..
quando a hora chega apertam mais forte, tudo sempre ao avesso.
Dança conforme a música. Dança e sussurra como confissão: "eu só quero que tu me ame".
Dança sem vingança e sem ódio, uma dança insossa e dissimulada.
Uma dança sem tino.
Aproveita devagar todo o sacrifício.. afia a alma masoquista.
O cheiro e o desejo.
O gosto e o desejo.
O som e o desejo.
A pele e o desejo.
Os pêlos e o desejo.
O desejo com os 5 sentidos.
E mais um cigarro aceso - e nojo.
E essa dança sem tino.
E as palavras sem lógica.

sábado, 22 de agosto de 2009

Do porquê falar e do porquê calar

Lendo o texto de Rose Pedrosa, "Quem não escuta, tagarela" (revista de Filosofia), vi uma inferência ao método pitagórico de educação, que incluía um período de 5 anos de exclusiva escuta, "tratava-se de uma prática que os pitagóricos impunham aos seus alunos. Eles deveriam escutar, somente, nada mais fazer senão escutar sem intervir, sem objetar, sem dar opinião, e, bem entendido, sem ensinar".
Meu primeiro sentimento foi de angústia, me colocar naquele lugar foi inevitável. 5 anos sem falar?? O pensamento que me veio em seguida foi sobre escrever. Será que também era proibido escrever? Qualquer modo de expressão? Como se derepente tu te tornasse somente um receptáculo funcional (ao menos aparentemente)?
Eu sou uma tagarela. Assumida. Vergonhosamente, mas assumida (junto com todas as minhas outras porcariazinhas que, eu compreendi, assumir me deixavam mais leve e feliz). Como todo bom pecado tem uma 'justificativa', aí vai a minha: organização. Falar, assim como escrever, me ajuda a me organizar. Me obriga a pôr relativa ordem naquela torrente de idéias que me passam cotidianamente. Mais: ouvir-se ou ler-se te convence dos teus absurdos ou das tuas razões, te ajuda a refletir, compreender, planejar.
Em geral quando pego uma caneta na mão não tenho lá muita idéia do que vou escrever.. só uma motivação, uma angústia, uma polarização - e me despejo em cima do papel, da mesa, quase caio pelo chão em busca da tão sonhada homeostase. Posso estar redondamente enganada, mas achei o método pitagórico por demais drástico, pra não dizer contraproducente. O objetivo, o mais nobre (todo bom pecado...), mas eu me arrisco denovo: a verdadeira escuta, a escuta ativa, interessada, vem da interação, não do receptáculo.
Ademais o texto é ótimo e eu recomendo. Rose ainda vai falar da escuta pelas perspectivas de Rogers, Quintana, e outros queridos.
E pra vocês? Por que falar? E por que calar?
Boa leitura! E bons papos!

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Que é isso de ser mulher?

Texto por Tatiane Bernardi que minha alma identificou como uma canção.

É brinco vermelho grande? Vou lá e compro. E já deixou de ser. Coça, arde, arregaça o buraco da orelha. Não é isso não. É botinha bico fino? É isso ser mulher? Vou lá e compro, e espreme meu pé pequeno com dedão grande. Pé estranho de menina. Com um pé desses, dá pra ser mulher? Mesmo com essas unhas pintadas de vermelho paixão? São pés de menina? Quase de menino. Sou quase um menino. Essa cabelo curtinho, as roupinhas de moletom que uso, porque tenho medo, já que sou mulher. O porteiro, o taxista, o cara da padaria, o faxineiro, o lindo rapaz e suas boas intenções. Todo mundo. Esse mundo é cruel com as mulheres. E com os meninos? Então lá vou eu, só falta um boné. Mas às vezes, quase sempre, fico numa taradice e preciso de pinto. Já que pinto, vejam só, não tenho. É isso ser mulher? Precisar de pau? E então me visto como uma puta, já que é pra ir direto ao assunto que saio de casa, já que odeio sair de casa. É isso ser mulher? Ter desespero? E vou, e fico mesmo tão bonita. Quando quero, não tem, não tem não. Eu vou mesmo e pego o que melhor me parecer. E como. Olha lá. Eu como. Porque a puta, meu amor, essas roupas que de vez em quando me invento, essas roupas, a puta, meu amor. Você não sabe? É puro pinto. É puro poder. E isso então, caramba, é ser mulher? Nada em mim é passivo. Tudo em mim fura, arrebenta, endurece, estoura na cara dos outros. Isso é ser mulher? Me diz! Por que no auge do meu buraco eu tenho mesmo é uma faca? Por que vou do menino com boné, e seu pinto, para a puta que tudo pode, com seu pinto? Onde está o caralho da mulher? E tudo isso, vejam só, porque pinto não tenho. O que é ser mulher? A minha loucura de mulher não me permite calar muito tempo, seria coisa de quê? De homem bobo? Homem bobo é que cala, pode reparar. Ou mulher de homem bobo. Quem cala? Mas se saio assim, me jorrando pro mundo, logo vem, o cansaço de não mais me sentir mulher. E a necessidade de me calar pra tentar ser. O que é então essa porra de ser mulher? Que é? É meu sonho, eu com medo do mar gelado e fundo e escuro e então, eu quero ajuda, eu quero pedir, alguém mais forte que me socorra, mas não posso perder e então, o que eu faço? Eu como o forte, para o forte ter. Eu como o pinto, para o pinto ter. Querer tanto ter, é coisa de mulher? Guardar no meu ventre a vida é mulher? Esparramar pro mundo é ser mulher? Tentar não vomitar o resto de tudo que ainda não encaixa aqui? O que é ser mulher? E o depois, esse estado deplorável que fico, arrasada, destruída, usada, podre. Que é isso? A ressaca de querer devorar o mundo e o dia seguinte totalmente cuspida por ele. O que é? É coisa de menina, sempre tem cara de menina. Também não é mulher. Daí, quando canso então, da puta homem, da menina assustada da puta homem. Quem vem? Vem a velha. A velha cansada de tudo isso, querendo dormir e tomar banho desses que esfrega pro tempo passar mais rápido e levar embora alguma coisa minha que dá essa liga insuportável com o mundo. A velha, a venha é ser mulher? O que é ser mulher. Hein? Quando eu vou com meu tênis e minha gola alta, ver um filme, só um filme, e nenhum batom na boca. É só porque tenho preguiça e nojo de mulheres que a tudo seduzem. E o tempo todo. O buraco aberto como um banheiro público. Eu sei meu papel e nele me encaixo, ó mundo sedento de minha vagina! Preguiça desse papel. Não quero. Seduzo quando estiver a fim, pode ser? Mas eles não deixam. Eu vejo os olhares. O homem da banca de jornal. O homem na fila do cinema. O olhar de você podia, mulher. Ser mulher. Tem uma mulher aí. Então, por quê? Hein? Por que não querer dar ao mundo isso que você tem, esse castigo e esse mérito. Esse de joelhos e esse chute no saco? Porque se “enfear”, menino, só pra me irritar? Ser mulher. Por quê? Porque tenho preguiça. E medo. Cansa ser toda uma espera. Mulher é dos pés à cabeça uma longa espera. Do elogio, do amor, do acolhimento, do nascimento, do se tornar. E eu, mundo, quero que você enfie esse seu charme da felicidade no cu. Enfia essa passarela no cu, mundo! Enfia mesmo. Eu só quero ver meu filme em paz. E não ter sexo. Ou, caso você venha querer que eu tenha mesmo algo, já que o tempo todo temos que nos definir pra não sermos definidos, então prefiro ter uma pica imensa, pra você nunca, nunca, nunca, ousar. Homem basta, percebe? Mulher ta sempre correndo atrás pra agradar. A passarela é nossa, e então, quem não quer, é o quê? Nunca, ouse. Chegar perto de roubar aquele meu riso nervoso e o medo do frio cortante. A coisa mais linda do mundo. Porque depois, depois dessa preliminar de menina, eu sou tão mulher. Tão mulher. Mas pra quê? Hein? Quem mesmo, até hoje, deu conta? Quem mesmo, até hoje, amou? Quem mesmo, até hoje, honrou? Quem mesmo, até hoje, me deixou ser mulher? Hein? Por isso, lá vou eu, meu tênis, o boné, os olhares. O que é ser mulher? Ser mulher é algo que simplesmente, embaixo de tudo isso. Você não vê? Eu trepo minha mulher pro mundo como um homem, enquanto não chega quem trepe minha mulher como um homem pra mim. Tanta força, mostrando pra todos esses pintos o quanto eles são moles sem isso que nem sei o que é. Mas que tenho. Sem nossa força, aquilo, aquilo é só uma massa sem direcionamento. É isso. Eu tremo quase de não terminar, precisava, é isso, escrever, ser a mulher que eu sou, não a mulher pra casar, não a mulher para um homem, não a mulher do namorado, não a mulher pra que digam “olha, uma mulher”. Mas isso, a mulher que sei ser e que, acreditem, é tão mais mulher que cabeças tolas a chacoalhar brincos grandes e rodar saias e seus babados e rebolar periquitas que jamais derrapam de amor no dia seguinte. E quem não vê, quem não enxerga, quem não ama, quem não sabe. Isso tudo, sabe, isso tudo não é o que vai me impedir, de não saber exatamente nem quando nem como ser mulher, mas acabar sendo tanto, tanto, tanto, que nem parece. Que nem dá pra ver. É isso. É ser obcecada pela própria natureza de já ser. É ser cega pro que invade de tão óbvio. Duvidar do que não tem se não. É o tempo todo querer ser mulher, ter medo de não ser, não saber ser. Ser mulher é a hipocrisia ao contrário. É a desgraça do avesso. É a simplicidade depois do choque. É tentar até o fim o que já nascemos sendo. É se tornar o que já se sabia mas dói tanto e se vai aos poucos. Um aos poucos todo esfolado por conta das aceleradas que é ser mulher. Ser mulher é um atropelamento em câmera lenta, que a cada frame é visto com a maior velocidade que sem tem notícias no mundo. Porque não é a saia, não é a cor. Também não é a loucura, a dor, o brinco, o casamento, o filho, o buraco, a roupa, o choro, a fragilidade, o grito. Não é nada disso. É o que passa despercebido pelo cara da fila, pelo nosso espelho. É o intervalo de todas as tentativas de ser e, principalmente, de não ser. Quando eu serei uma mulher? Ser mulher é esperar ser mulher até o fim. Ser mulher é somente morrer tentando.

sábado, 15 de agosto de 2009

As madrugadas não, e elas são minhas - Postagem Temática

Tudo bem, eu precisei de três semanas de terapia pra conseguir te dizer isso. Céus! Três longas semanas com os 45 minutos de cada terapia para agora dizer tudo ao contrário do combinado naquelas sessões.

Mas eu vou dizer.

Não, eu não quero pensar melhor.. aliás, eu tenho pensado demais e esse é o grande problema! Eu sempre pensei muito mas eu sempre fui impulsiva também e isso equilibrava as coisas por que eu acabava pensando depois de ter feito e assim as coisas sempre aconteciam.

Agora não, agora tem você e tem também a terapia.

Todas as coisas que flagelam e contêm a minha impulsividade.

Entretanto, não é por isso que eu vou te dizer as palavras fatídicas. Eu já te odiava pelo teu improvável, mas eu te odeio realmente e mais por me roubares as madrugadas.

O que eu posso fazer sem as minhas madrugadas? Transformadas em horas improdutivas, cheias de taquicardia, de frases lidas três vezes, de livros saindo do prazo. Cheias de impaciência, de vinho, de calmantes. Cheias de vinho com calmantes.

Eu poderia suportar tudo. Eu poderia ceder aos teus caprichos, eu poderia rir dos teus risos, poderia me despir aos teus olhos e te vestir ao meu modo. Poderia escutar tuas canções e freqüentar teus lugares. Poderia agüentar teus amigos, poderia até me tornar tua amiga também, mas tu não podes acabar com as minhas madrugadas, entende?

Isso não, isso eu não admito.

No fim das contas, a solidão é democrática.. mas as madrugadas não, e elas são minhas.


dentro da proposta do: http://blogsintonizados.blogspot.com/

sugestão: pueril

terça-feira, 11 de agosto de 2009

E Sartre, han?

Desde que conheci Sartre simpatizei com sua liberdade irrefutável de cara. Ao contrário de outras pessoas, que se sentiam desconfortáveis com a responsabilidade que tal liberdade carregava eu me senti muito bem com a segurança que vinha dessa responsabilidade. Meu raciocínio é simples: quanto mais porcentalmente meu destino depender de mim, mais porcentalmente poderei controlá-lo. Essas coisas todas de controle e descontrole são confusas.. e também são assunto pra outro post, deixemos de lado por enquanto.

Agora, pela primeira vez até então, eu me vejo em cheque com Sartre. O nome: relações.

Quem acompanha meu blog há mais tempo ou me conhece pessoalmente sabe que eu sai há 6 meses de uma relação de 5 anos. Uma relação com toda minha liberdade de decisão. A liberdade de apostar tudo, investir tudo e a liberdade de errar ao máximo e de me anular ao máximo. Abri mão de todas essas liberdades há 6 meses pra vivenciar outras. Entretanto, nada me parece liberdade agora nas relações. Quando eu paro pra pensar em todo o meu investimento, eu vejo que não houve liberdade ou decisão alguma.. sim! Eu fiquei totalmente à mercê do destino, quiçá de outra pessoa! Que porra de liberdade é essa?? (com o perdão da palavra, à serviço do dramático no texto)

Quando eu vejo alguns casais que me parecem felizes, eu calculo e recalculo o quanto eu posso estar me enganando ou até o quanto eles podem estar enganando a si mesmos e tudo isso não parece feito pra mim. Não parecia feito por que eu não pensei encontrar alguém que eu admirasse o suficiente pra acreditar numa coisa dessas denovo, e agora não parece feito por que pasmem, talvez eu não acredite mesmo é no amor. Não acredite que ele seja suficiente ou pelo menos não acredite que ele dure. E acredito menos ainda na minha liberdade dentro dele.

A insegurança faz com que nos agarremos a nós mesmos, a pessoa que conhecemos há mais tempo, a relação que invariavelmente deu mais certo até agora e provavelmente a que dará mais certo até o fim dos tempos, do teu tempo. Eu estou agarrada à mim mesma com toda a minha força, agarrada à minha solidão ensolarada, mas sabe o que Christopher McCandless me disse hoje? Que "a felicidade só é real quando compartilhada". Agora me diz, onde é que fica Sartre nisso tudo?